A maioria das pessoas vive atribulada na correria da vida:
trabalho, estudo, família, casa, sem observar um tempo de nutrir a própria
essência, até mesmo para ter mais vida útil e produtiva.
Uns dizem: trabalho,
trabalho, trabalho; outros: diversão,
diversão...
Quem sabe devêssemos considerar o equilíbrio, conforme o
Taoísmo, e caminhar procurando viver cem anos a cem? Do popular: É devagar que se vai longe.
Desfragmentador
Até mesmo uma máquina, o computador pessoal, por exemplo,
possui um sistema de organização de memórias, que visa otimizar seu
funcionamento no tocante à velocidade com que o computador lê seus arquivos, tornando
a leitura dos mesmos mais fácil e rápida. O nome desse dispositivo é desfragmentador de disco.
Desgaste
Pessoas que ficam remoendo ou revivendo o passado, não muito
raro tendem a depressão. Assim também, aquelas que cultuam o futuro,
preocupadas em atingir metas, viver somente do futuro, com a mente sempre no
que ainda poderá acontecer, tendem à ansiedade. Em ambos casos, os estados
mentais promovem desgastes, esvaziamento de seu Qi (sopro vital).
Fatores mentais e emocionais mantêm ou modificam todo o nosso
micro sistema multidimensional, para um lado ou outro. Vai depender somente da
média dos Pensenes gerados em nossa manifestação diária. Dai a importância das
pausas meditativas de reconexão.
Nas palavras de Deepak Chopra:
“Nós somos as únicas criaturas do planeta que podem modificar
a própria biologia através dos pensamentos, sentimentos e intenções.”
E o desequilíbrio, a doença é o
recurso que o organismo tem para sinalizar que perdemos o rumo, o alinhamento
com a rede de sustentabilidade, com a fonte geradora do padrão vibratório de
harmonia, fonte promotora da homeostase holossomática.
Aqui entramos nos conceitos
filosóficos do TAO, a unidade que tudo mantém no processo de sustentabilidade.
O TAO
O Tao é o Caminho da espontaneidade natural.
É o que produz todas as coisas que existem e que inexistem.
Pode ser considerado como a Divindade, o Absoluto, o Eterno, o Insondável, a Consciência
Cósmica.
O conceito de Tao só pode ser apreendido por intuição. É algo muito simples, mas não pode ser
explicado. Temos demasiados conceitos internos para o entender como um todo
uno.
O Livro do Caminho das Virtudes Supremas, Tao Te King de Lao
Tsé, em seu primeiro poema intitulado TAO, diz:
O Tao que pode ser
expressado não é o Tao Absoluto.
O nome que pode ser
revelado não é o nome absoluto.
Sem nome, é o
princípio do Céu e da Terra.
Com nome, é a Mãe de
todas as coisas.
Assim, quem permanece
sem desejos contempla o Misterioso Princípio.
Quem guarda desejos
contempla o limite das aparências.
Ambos são idênticos na
sua origem.
Diferentes são seus
nomes ao fazer-se manifestos.
Este mistério chama-se
infinita Profundidade.
Profundidade não
desvelada pelo homem.
A porta de todas as
maravilhas do Universo.
Para compreender essa sabedoria de Lao Tsé, deve o iniciando
mergulhar em meditação para alcançar a real filosofia do ensinamento.
Alinhamento
A busca do alinhamento com o Tao irá proporcionar uma harmonização multidimensional, onde estará presente a saúde nos diversos níveis:
mental, emocional, energético e consequentemente físico.
Este alinhamento deve começar pela postura física, observar
as emoções e acalmar os desejos para relaxar a mente.
Como um diapasão metálico em forma de garfo que, por
ressonância, faz vibrar a corda do violão que estiver no mesmo tom, quando
obtivermos o centramento corpo/mente/espírito, a ressonância com o TAO estará
em andamento.
``O ontem é história, o amanha
mistério, mas o hoje é uma dádiva, por isso que se chama
Presente!
´´ Mestre Hugo do Filme Kung Fu
Panda
Presente
O presente, o aqui/agora multidimensional contém a diretriz;
é no presente que temos a chance de nos manter alinhados, procurando entrar em
ressonância com o TAO. Quando isso acontece, nosso micro universo começa a vibrar saúde, tornando-se a vibração natural de harmonia
do Universo.
Treinos meditativos podem promover a organização e o refazimento
bioenergético mental, emocional e físico.
Observando algumas formas de meditação ou mentalização, pude
chegar à utilização de três técnicas que, em conjunto, poderão dar resultados
mais eficazes:
4º video: Apresentação do Tai Chi Chuan com Leque - 18 formas Yang
e Demais fotos desse artigo foram copiadas do site da Deputada Erika Kokai
Materia de O GLOBO - Isabel Braga
Publicado em 12/04/2013
Mestre Woo, Ministro José Meira
e Deputada Erika Kokai
... Na presença de apenas três deputados, mas dezenas de convidados, o clima foi bem diferente. As pessoas estavam serenas e se encantavam com as apresentações de Tai Chi que intercalavam os discursos na tribuna, que pregavam a paz e enalteciam os benefícios da prática para a mente e o corpo. O Dia Mundial do Tai Chi Chuan é comemorado no dia 27 de abril.
Deputada Erika Kokai e Mestre Woo
Na mesa que presidiu a sessão, além da deputada Erika Kokay (PT-DF), autora da sessão solene, estavam o mestre Moo-Shong Woo, que há 39 anos ensina a prática do Tai Chi, de graça, em uma das quadras do Plano Piloto. O monge Shojo Sato, do Tempo Budista de Brasília e o ministro José Castro de Meira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adepto da prática, também fizeram questão de estar presente à homenagem.
... Antes de encerrar a sessão, mas em clima zen, Erika Kokay afirmou:
- Quero enfatizar a necessidade de encararmos os seres humanos com iguais direitos e liberdades. Vivermos, a cada dia a lógica da igualdade e da paz. ...
Será realizada Sessão Solene referente ao Dia Mundial de Tai Chi e Chi Kung no dia 12 de abril, às 15h , no Plenário Ulysses Guimarães - Câmara dos Deputados. Na ocasião será também homenageado o Mestre Moo Shong Woo, pelo seu trabalho voluntário de trinta e nove anos à frente da prática diária e gratuita de Being Tao Tai Chi Chuan, na PHU-Praça da Harmonia Universal, situada na entre-quadra norte 104/105 (EQN 104/105) em Brasília.
TODOS ESTÃO CONVIDADOS A PARTICIPAR DESSE EVENTO.
Dia Mundial de Tai chi chuan e Chi Kung é um evento realizado anualmente no último sábado do mês de abril para divulgar e promover as práticas de tai chi chuan e chi kung pelo mundo. Faz parte do calendário de eventos estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde, durante a comemoração do Mês da Saúde (Abril). A missão é divulgar publicamente o crescente conjunto de pesquisas na área médica relacionada as práticas corporais da MTC-medicina tradicional chinesa.
Mestre WOO - Dia Internacional do Tai chi chuan & Qi Gong - 2011
PHU- Praça da Harmonia Universal - EQ 104/105 norte - Brasília 2011
O Chi Kung,traduzido literalmente por exercício, trabalho ou cultivo do sopro vital, não foi criado por um único indivíduo e resulta de milhares de anos de experiências dos chineses no uso da bioenergia para tratar doenças, promover a saúde e longevidade, melhorar as habilidades de luta, expandir a mente, alcançar diferentes níveis de consciência e desenvolver a espiritualidade. Apesar das diversas técnicas de Chi Kung terem se desenvolvido separadamente em diversos locais da China, em muitos casos se influenciaram mutuamente. Derivado de técnicas milenares conhecidas como Tao Yin (Tipo de meditação – Sentar na Calma), o Chi Kung como é conhecido nos dias de hoje remonta à época da Dinastia Han (206 aC - 220 dC), quando começou a ser sistematizado. O próprio uso do termo Chi Kung é relativamente recente, data do início do século XX, sendo utilizado atualmente para referir-se a múltiplos exercícios, destinados a desenvolver a força (física, bioenergética, mental ou espiritual) ou para fins terapêuticos, mediante a utilização do Sopro Vital - Qi.
Objetivos do Curso:
HarmonizaroCorpo e a Mente.TratarosSistemasImunológico, Neurológico, e Emocional (Insônia,
Ansiedade, Estresse,Enxaqueca, dentre outros). Circulação
Sanguinea e ColunaVertebral.
Dia:14/04/2013Hora: 09hsas 15hs
Local: 915Sul ED ADVANCESala/S1-138 Professor: Dr. WangH.Po(aulas teóricas e práticas)
Fone: 61-3346-8068 61- 9988-7700
Investimento do curso: R$ 360,00
Preço especial para Inscrições até o dia 08/04/2013 e Para alunos de Tai Chi Chuan.
(Valor com desconto)R$ 280,00.
Tópicos que serão abordados no curso
1 – O que é Qi Gong (Cultivo do sopro vital)?Conceito,
Características e estilos?
2 – O papel do Qi Gong sobre os reinos mineral,
vegetal, animal e sobre a biologia humana?
3 - Qual é o estado mais elevado de
auto-cultivo?
4- Três tipos de auto-cultivo?
5 - A importância da respiração e atenção no Qi
Gong?
6- Concentração, respiração e o papel do
movimento do corpo humano no Qi Gong?
7 - Consciência, subconsciência e Superconsciência
- Conceitos
9- Idéia, Qual é o seu papel no Qi Gong?
10- Qual a diferença entre energia positiva e
energia negativa?
11- Qual a função das doenças?
12- QUAIS OS CUIDADOS QUE DEVEMOS TER AO
MEDITAR?
14- MANTRAS
15- Como aumentar a Imunidade?
16- QUAL a melhor ALIMENTACAO?
19- FUNÇÃO DOS CHACRAS
21- MEDITACAO
a) Periodicidade ...b) Tempo...c) Melhor hora...
22- QUAL RESPIRACAO CORRETA PARA NÃO
INTERROMPER A MEDITACAO?
23- Qual é o significadodo uso combinadode
exercícios, emoções eidéias?
A medicina tradicional chinesa vem se
firmando no cenário internacional como uma das mais procuradas alternativas aos
tratamentos da medicina convencional. Contudo, esta medicina dita tradicional
vem na realidade se formando continuamente: paradigmas anteriores não são
eliminados ou superados, mas passam a orbitar as idéias mais recentes,
guardando destas maior ou menor distância de acordo com o grau de ruptura ou
segundo a agenda política do momento. Dessa forma, a medicina chinesa tornou-se
uma colcha de retalhos onde coexistem idéias e práticas oriundas de períodos
históricos e de paradigmas diferentes. Como o Projeto Racionalidades Médicas,
em cujo âmbito foi produzida uma primeira versão deste material, focalizou sua
atenção nos serviços da rede pública de saúde do Município do Rio de Janeiro,
com seus profissionais, usuários, suas representações de corpo, cura, doença,
tratamento, médico, doente, medicina etc., a “medicina tradicional chinesa” de
que vamos tratar é a que pode ser encontrada nesses serviços e que se ensina
nos cursos de formação disponíveis nas instuições brasileiras de ensino de
acupuntura, com certas variações de escola para escola. Não pretendemos em
nenhum momento defender que esta medicina chinesa, atualmente conhecida como
MTC, seja mais legítima que suas outras versões, mas o fato é que é desta que
milhares de pessoas doentes procuram resposta, quando todos os recursos já se
esgotaram, e é nesta que milhares de estudantes no mundo todo depositam suas
esperanças de melhor atender aos que sofrem. É, portanto, sobre uma determinada
forma de medicina tradicional chinesa, de estruturação bastante recente, que
iremos aplicar o conceito de Racionalidade Médica: a MTC.
A sigla “MTC” tem sido atualmente
utilizada para designar especificamente uma versão de medicina tradicional
chinesa criada na China pós-revolucionária e difundida para o mundo a partir de
grandes centros de estudo e ensino como a Faculdade de Medicina Chinesa de Shanghai,
e que enfatiza, como ferramenta de diagnose, o sistema dos “Oito Princípios”,
que descreveremos mais à frente. Esse sistema, que procura localizar o
adoecimento e, ao mesmo tempo, determinar sua natureza segundo o paradigma do Yin/yang
, tem como principal competidor no mercado internacional de ensino e prática de
acupuntura a escola dos “Cinco Elementos”, que tem como principal expoente no
Ocidente a escola do prof. Jack Worsley, em Leamington Spa, na Inglaterra
(Eckman, P. 1996). Outras formas de medicina tradicional chinesa, que enfatizam
outros aspectos da cosmologia, diagnose e terapêutica são por vezes chamadas de
“Medicina Clássica Chinesa”, “Medicina Tradicional Oriental”, ou “Medicina
Tradicional do Leste Asiático”Tais correntes de medicina tradicional chinesa
freqüentemente denominam a si mesmas de “verdadeiramente tradicionais” e
criticam a MTC como “reducionista” - crítica a qual, em nossa opinião, não é
desprovida de mérito: como as doutrinas fundamentais que embasam as diversas
formas de medicina chinesa surgiram por volta 2 a.C e refletem, até certo
ponto, a visão de mundo de seu tempo, é inevitável que haja áreas de conflito
com o pensamento oficial do atual governo chinês. Um exemplo é a que trata dos
“espíritos” (shen) que habitam o homem, residindo em seus órgãos. Tais
conceitos são hoje em dia vistos como “feudais” e representativos do
"atraso", o que dá origem a uma revisão dessas doutrinas sob uma
ótica marxista: fala-se atualmente em "dialética materialista primitiva do
Yin/yang" (SIVIN, N. 1987), por exemplo. Recomendamos aos estudiosos e
praticantes que levem em conta a existência dessa agenda política antes de
tomarem a produção atual da China continental como referencial do que é
verdadeiro em medicina chinesa. Por outro lado, essa revisão, ela mesma, pode
ser vista como um movimento típico do processo de transformação do pensamento
chinês. Cada nova dinastia trazia consigo novas moedas, padrões de pesos e
medidas, de bitola de rodas de carroça etc, como se a história começasse com
ela (mas ao mesmo tempo fundamentando sua legitimidade com releituras
convenientes dos clássicos para ganhar o poder ratificador dos ancestrais).
Para a transliteração dos sons do
dialeto mandarim, adotei o sistema Pinyin da China continental, sugerindo entre
parênteses uma aproximação para leitores de língua portuguesa, por exemplo: taiji
quan (t'hai dji t'chuan), exceto quando óbvio, como em yin/yang ou Wu (Uú) Xing.
Os termos grafados em maiúsculas correspondem a conceitos que, na Racionalidade
Médica Chinesa (RMC), possuem uma acepcção técnica bastante diversa de seu
emprego em linguagem coloquial, como os nomes dos órgãos internos da RMC: Coração,
Intestino Delgado, os seis fatores climáticos (Frio, Umidade) etc[ii].
AS SEIS DIMENSÕES DA RACIONALIDADE
MÉDICA CHINESA
Dra Madel Luz
A categoria Racionalidade Médica foi
criada pela profa. Dra Madel Luz em 1991 para estudar sistemas médicos
complexos. É uma categoria idealtípica Weberiana que postula indutivamente que
um sistema terapêutico complexo, para ser uma Racionalidade Médica, possui
necessariamente seis dimensões: uma cosmologia, a própria tessitura cultural
com suas imagens e representações de onde emanam e onde se ancoram as demais
dimensões; uma morfologia, ou descrição do corpo humano; uma dinâmica vital,
conjundo de explicações racionalmente elaboradas sobre o fenômeno da vida
humana; uma doutrina médica em que causas, efeitos e definições do adoecer são
explicados e repertorizados; uma diagnose desses padrões ou doenças e uma (ou
várias, no caso da RMC) terapêutica (Luz, M. 1992).Descrever essas seis dimensões da RMC é o
propósito central deste texto.
Cosmologia da RMC
Muitos autores de RMC,
quando querem validar suas idéias, se remetem à uma “tradição chinesa”. Ao
fazerem isto estão sendo bem “sínicos”, partilhando do referencial chinês de
buscar a validação no passado e na tradição ao invés de no avanço e na
modernidade.É uma estratégia, contudo,
que cria a falsa impressão de que, de fato, existe uma tradição chinesa, o que
não é o caso. O aluno que começa a estudar RMC partindo desse pressuposto se
desespera quando chega aos clássicos, sempre citados para corroborar os textos
mais recentes mas, muitas vezes, contendo também noções e conceitos
aparentemente contraditórios com esses mesmos textos. Existe uma complexa teia
de interações, com alguns momentos de afastamento, outros de aproximação, entre
várias escolas e tradições que surgiram ao longo da história, ao invés de um
grande consenso. É portanto de um conjunto fundamentalmente heterogêneo que foram
selecionados os sete conceitos-chave que constituem a Cosmologia da RMC. São
estes: Dao (Tao), Céu anterior e Céu Posterior, taiji, qi, yin/yang, wu xing e san
cai (sen ts'hai). Estes sete conceitos e o resultado de suas interrelações nos
parecem fornecer uma base conceitual suficientemente abrangente para ancorar
todas as demais dimensões da RMC.
Dao
Dao é o conceito central do
Taoísmo, uma corrente de pensamento chinês que se divide em duas grandes
escolas: o daojia, chamado de “filosófico” e o taoísmo dito religioso, o daojiao
(taodjiáo). O primeiro propõe a experiência mística da identificação direta com
o Dao, enfatizando a meditação e a ação espontânea, não-premeditada,
representada pela noção de Wu Wei, o “não-agir”. Seus maiores expoentes são Laozi,
(Séc.V a.C.?) e Zhuangzi (369-286 a.C.). A segunda corrente, representada por
diversas escolas, busca a ascenção espiritual que tem como ponto máximo a imortalidade
e venera um vasto panteão organizado à maneira de uma repartição pública. Tem
como principal cânone o Daozang, que em sua edição de 1118 contava com 5.481
volumes (Dictionnaire de la Sagesse Orientale, 1989).
O ideograma Dao é composto de duas
partes: uma significando “cabeça”, e a outra, “pé”. Dao pode ser traduzido como
“caminho”, “via”, que se segue conjugando ação (pé) e reflexão (cabeça). No
taoísmo daojia, que tem forte influência na formação dos conceitos da RMC, o Dao
"é" a origem não-dual do cosmo. Evidentemente, uma vez que precede a
dualidade ser/não-ser, não se pode dizer que "seja" a origem disto ou
daquilo. É portanto indescritível, posto que qualquer descrição supõe
necessariamente a existência de uma dualidade observador/fenômeno. Segundo o
Tao Te King (Daode Jing):
O Dao é o Princípio primeiro de onde
se originam espontaneamente todas as coisas e fenômenos do universo. Nesse
sentido, é assemelhado a uma mulher, fonte da vida humana:
Apesar de misterioso, profundo e
inenarrável, o Dao pode ser experimentado diretamente pelo Homem. Para tanto, o
taoísmo filosófico preconiza a realização pessoal da unidade com o Dao, que se
obtém na simplicidade e, sobretudo, na prática da ação não-intencional,
espontânea e livre de desejo de sucesso ou medo de fracasso representada pelo
conceito de Wu Wei (Uú Uêi), a “não-ação”:
Ch'ui o projetista
Sabia desenhar círculos mais perfeitos a mão livre
Do que a compasso.
Seus dedos traziam
Formas espontâneas do nada. Enquanto isso, a mente
O conceito de Dao fundamenta a idéia
chinesa de saúde, vista como uma “ordem vital”: Esta seria menos um
“equilíbrio” do que um padrão ou uma configuração de processos interligados num
constante fluxo que naturalmente muda de matiz para se adaptar as mutações
naturais do Céu e da Terra. Este padrão cambiável da ordem vital mantêm a vida
com bem-estar físico e temperança nas emoções e com a perspectiva de viver-se
todos os anos possibilitados pela sua herança vital, sem decrepitude ou
sofrimento.
A reflexão chinesa sobre o homem nunca
é feita dentro de um referencial puramente subjetivo: o homem sempre está
referenciado ao Céu e a Terra e também, com freqüência,ao Estado. Assim, o Dao é também a via
correta que os cidadãos e os governantes devem seguir para a prosperidade e
ordem do reino (e, por extensão, para manter a saúde individual):
Vejo quão grande é tua virtude, e quão admiráveis tuas
vastas realizações. A escolha específica do Céu recai sobre ti; eventualmente
deves assumir o trono do grande soberano. A mente das gentes está inquieta e
fadada ao fracasso, e seu desejo de seguir o dao é pequeno. (Shujing)[vii]
Se na morfologia da RMC veremos que o
corpo é visto como um micro-estado, em que centros urbanos e grandes celeiros
(os órgãos e vísceras) trocam suas riquezas e produção específica através de
hidrovias (os Canais), é natural que haja um administrador desse Estado. Essa
noção representa uma ruptura com as tradições anteriores, em que o bem-estar da
comunidade bem como do indivíduo estava condicionado aos caprichos de entidades
sobrenaturais. Agora, a própria pessoa passa a ser responsável pelo
gerenciamento do Estado do seu ser. Esse gerenciamento tem sua eficácia ligada
à idéia de seguir o Dao o que, na concepção confucionista da expressão, é feito
através da observação da moderação na conduta e rejeição dos excessos.
Uma vez que este é indescritível e
inenarrável, “seguir o Dao” equivale na prática a “seguir o yin/yang”, que é a
forma pela qual o mistério do Dao se revela no mundo:
Seguir o yin/yang, eis a vida. Contrariá-los, eis a
morte. Segui-los é a cura [é legislar],
O fato de a palavra zhi (dj^h)
significar tanto “curar” quanto “legislar” [ix]
e de que a expressão “caos”, utilizada para sublevações e perturbações no
reino, seja utilizada para aludir à doença individual, ilustra mais uma vez
como, no imaginário médico chinês, as idéias de cuidar da saúde e gerir o
Estado estão imbricadas.
Céu Anterior e Céu Posterior
"Céu Anterior" é uma
expressão encontrada primeiramente no Clássico das Mutações, o Yijing (I
Ching). Um dos mais famosos livros de sabedoria chinesa, traduzido para
virtualmente todos os idiomas, o Yijing representa o yin por uma linha
descontínua e o yang por uma contínua, que se reúnem em oito grupos de três
linhas (os trigramas básicos) de cuja combinação dois a dois resultam 64
hexagramas que, corretamente interpretados, apontam a natureza original e o desenvolvimento
futuro de qualquer situação. Sua primeira compilação provavelmente data do
período de transição entre as dinastias Shang e Zhou (circa XI a.C?).
No Yijing, Céu Anterior é o estado que
precede o surgimento do universo manifesto, e Céu Posterior é o mundo das
manifestações e dos fenômenos, referidos na tradição taoísta como "dez mil
seres". O Homem vai procurar no Céu Anterior a origem das situações, no
Céu Posterior,encontrará seu desenlace.
Note-se que quando falamos em "Céu Anterior" estamos construindo uma
relação dual com "Céu Posterior" - um pressupõe o outro. Já a
noçãode Dao não possui um oposto, já
que não existe nada fora (ou dentro) dele.
Na RMC essas noções estão relacionadas
às propriedades inatas e às propriedades adquiridas. No momento anterior à
fecundação, temos o Céu Anterior representado pelas potencialidades de
manifestação da nova vida, limitadas pelas características dos genitores (Rochat
de la Vallée, E. et al. 1979). No momento da fecundação é dado o impulso
organizador característico daquele ser, tanto em sua dimensão racial e genérica
quanto individual. Esse impulso inicial estabelece um dos mais importantes aspectos
da vitalidade humana na RMC: o qi original yuan qi (Iuén Tchi). Criado no
momento da concepção, O qi original tem a incumbência de gerenciar as
influências do Céu e da Terra, organizando a fisiologia vital de acordo com o
que foi conformado na fusão das essências do pai e da mãe.
Taiji
Taiji pode ser traduzido como
"Cumeeira Suprema", "Ápice Máximo" ou " Viga
Mestra". É representado no taiji du (t'hai dji tú), o "Diagrama do Taiji",
o símbolo dos dois peixes que atualmente consiste num dos objetos favoritos de
predação do marketing, ao lado do Ohm indiano. O taiji é a linha que, naquele
diagrama, ao mesmo tempo define, une e divide yin e yang, sem que se possa
dizer que pertença a um ou a outro. O taiji caracteriza a natureza polar de
nosso universo e estabelece que entre os pólos existe um movimento contínuo de
emergência, crescimento, plenitude e decréscimo, numa alternância gradual e
harmoniosa entre yin e yang. O taiji é a "mãe do yin/yang", que é a expressão
do movimento fluido que caracteriza o Dao. Assim, o taiji é o eixo através do
qual o Dao vai encontrar sua expressão tangível:
Ou seja: do Dao vem o taiji, o eixo
supremo; o taiji supõe o dois (o yin/yang), o qual por sua vez gera o trinômio
Céu (yang) / Homem (yin/yang) / Terra (yin). É da interação do Céu com a Terra,
no plano intermediário, que surge a multiplicidade das coisas.
Qi
Literalmente, "os vapores que
emanam do solo (ou da fermentação do arroz) em direção ao céu"[xi].
Muitos autores no Ocidente e no Oriente equivocadamente traduzem esse conceito
por “energia”. Se tivéssemos que utilizar um termo em português para traduzir “qi”
- algo talvez indesejável - me parece melhor a expressão "Sopro
Vital", uma vez que, em mandarim, a palavra qi compõe palavras como ar (kongqi),
gás (qiti), fragrância (xiangqi), traquéia (qiguan) e está ausente de conceitos
ocidentais de energia como eletricidade (dianliu, dianneng), magnetismo (cixue),
gravidade (diqiu yinli) e energia atômica (yuanzi neng). Seufluxo desloca a matéria (a agitação do qi do Fígado
é chamado de "Vento Interno", e provocatremoresno corpo); em exercícios chineses como o taiji quan o qi pode ser levado
a se condensar para enriquecer a medula óssea, num processo semelhante à
condensação do vapor d’água; a RMC identifica a fraqueza da voz com
insuficiência de qi; os qi gong (tchi cûn), treinamentos chineses do qi,
geralmente têm na respiração um elemento fundamental.
Na Cosmologia da RMC, aspectos,
polaridades ou modalidades do qi são o yin/yang e as Cinco Fases, que surgem da
divisão do qi primordial:
"Quando o Céu e a Terra ainda estavam misturados,
nada existia além do Um indiferenciado. Esse Um foi dividido; assim nasceram o yin
e o yang. Aquilo que recebeu o yangqi ascendeu, claro e leve, e tornou-se o
Céu. Aquilo que recebeu o yin qi se aprofundou, sombrio e pesado, e tornou-se a
Terra. E aquilo que recebeu tanto o yin qi quanto o yang qi e se mostrou justo
e equilibrado foi o Homem." (Baopuzi)[xii]
É o qi que mantém a vida; sua
circulação é vista como essencial para a manutenção da saúde:
"O Homem está no qi e o qi está no Homem. O Céu, a
Terra, os Dez Mil Seres, todos necessitam do qi para se manter vivos. O Homem
que se dedica a fazer circular seu qi preserva sua pessoa e afasta de si todo o
mal que poderia lhe ferir."(Baopuzi)[xiii]
Yin/yang
São os dois pólos que, ao se oporem,
se complementarem e se definirem mutuamente pela ação do taiji, caracterizam a
natureza cíclica e dual do universo. Toda e qualquer coisa ou evento pode ser
concebida como um estado particular de yin/yang, sempre de forma relativa.
Podemos fazer algumas associações ilustrativas:
Tabela 1
Yin
yang
implícito
curva
absorver
recolher
forma
norte
noite
escuro
frio
água
preto
inverno
baixo
ventre
feminilidade
“vísceras maciças” :zang
Sangue
explícito
reta
expelir
expandir
idéia
sul
dia
claro
quente
fogo
vermelho
verão
alto
dorso
masculinidade
“vísceras ocas”: fu
qi
Se yin e yang se alternam, há harmonia
e saúde. Se o círculo se imobiliza, levando ao predomínio exagerado de um sobre
o outro, sobrevêm o caos, o adoecimento.
A interação de yin/yang gera as Cinco
Fases wu xing.
Wu Xing
A teoria das Cinco Fases ou dos cinco
movimentos, cuja formulação é atribuída a Cou Yen (Ts'hou Ién, 350-270 a.C.)
postula que todos os fenômenos naturais correspondem a uma de cinco faixas associativas:
Madeira, Fogo, Terra, Metal e Água.
No tocante à posição da Terra no ciclo
sazonal, os autores divergem: a MTC defende que a terra possui uma estação
própria, a canícula ou Chang Xia (lit. "verão longo"), que se
situaria ao final do verão. É a época de chuvas, momento em que o ciclo de
plantio e colheita era definido, estando em jogo a própria sobrevivência das
comunidades. Contudo, há uma corrente que se fundamenta no Neijing para afirmar
que a terra não preside uma estação própria, recebendo ao final de cada estação
18 dias de comando (Eyssalet, J.M., 1988).
Essas Cinco Fases
estabelecem uma série de relações ou ciclos entre si. Os principais ciclos
naturais, que explicam os fenômenos vitais do corpo humano são os ciclos de
geração (Sheng) e de restrição (Ke). O ciclo de geração postula que a Madeira
alimenta o Fogo; o Fogo (através das cinzas) nutre a Terra; a Terra gera o
Metal; o Metal, se liqüefazendo, gera a Água; a Água alimenta a Madeira. No
ciclo de destruição, bem como nos ciclos doentios de encontramos a idéia de restringir:
a Madeira fura a Terra (como as raízes); a Terra represa a Água; a Água apaga o
Fogo; o Fogo derrete o Metal; o Metal corta a Madeira. Os ciclos desarmônicos
de supradomínio e contradomínio estão ligados ao excesso de atividade de uma
fase: no primeiro, o elemento restritor torna-se excessivo e passa a destruir
em vez de apenas moderar. No segundo, a fase moderada (por exemplo, a madeira
em relação ao metal) torna-se excessiva e passa a agredir seu moderador.
É sempre bom
lembrar que estamos tratando da apresentação contemporânea da MTC.
Historicamente, as escolas do yin/yang e das Cinco Fases se opunham. Quando da
consolidação do confucionismo como doutrina social ortodoxa da China imperial,
e a conseqüente elevação da escola das Cinco Fases à condição de medicina
oficial, a escola do yin/yang acabou por "explicar" a existência de Cinco
Fases - seja dividindo-se uma delas (o fogo) em duas - fogo príncipe e
fogo-ministro - obtendo assim seis elementos, distribuindo três fases para o yin
e três fases para o yang, seja atribuindo a neutralidade a uma delas - a Terra,
considerada "central" -, distribuindo as quatro restantes entre yin e
yang. (Unschuld, P., 1985).
San Cai
Traduzido normalmente por "Três
Poderes" ou "Três Instâncias", refere-se ao trinômio
Céu-Homem-Terra. Como já vimos, o Céu forma-se pelo acúmulo de yang; a Terra,
pelo acúmulo de yin. O Homem faz a ligação entre os dois, sempre buscando
acompanhar as trocas de suas influências (Rochat de la Vallée, E. et al. 1979).
Recebe do Céu o ar, a luz e as qualidades sutis ou “espíritos” (Shen[xvi])
que nele residem nos cinco zang; da Terra a substância, a essência vital e o
sabor dos alimentos, que vão tecer o espaço material em que se passam as
atividades vitais.
As demais categorizações (yin/yang e Cinco
Fases), ao se superporem à noção de San Cai, vão possibilitar o estabelecimento
de relações de correspondência entre essas três esferas: aquilo que no Céu é o
Vento, o leste é a cor verde, na Terra é a Madeira e o sabor ácido, e no Homem
é o Fígado, a visão, os tendões, a raiva, a iniciativa viril.
Em resumo...
O universo dual origina-se na vacuidade
inescrutável, não-dual, que é o Dao. O Dao vai se valer do taiji para gerar a
expressão tangível de sua natureza, o reino da dualidade, dividido entre yin e yang
. O acúmulo de yang dá origem ao Céu. O Acúmulo de yin dá origem à Terra. Entre
Céu e Terra caminha o Homem, harmonizando em si as influências dos Sopros
Celestiais e Terrenos. O desdobramento de yin/yang gera as Cinco Fases, que
compõem e caracterizam todas as coisas e movimentos - os Dez Mil Seres. A
normalidade (prevenção ou cura) se consegue harmonizando a dinâmica do Homem
com as dinâmicas do Céu e da Terra, pressupondo uma ordem vital em constante
movimento, nunca “equi-librada”.
A Morfologia da RMC
A morfologia da RMC difere da
ocidental principalmente na medida em que descreve um corpo tecido e também percorrido
pelo qi. Neste corpo há centros de produção e locais de armazenamento do qi,
portas de comunicação com o(s) qi do meio externo e uma série de estruturas de
transporte e regulagem do fluxo do qi no corpo, dando a idéia geral de um
estado cujas províncias transportam sua produção de capital para capital
através de hidrovias. Ademais, o qi é uma instância de regulagem dos tecidos
corpóreos, tendo uma posição de regência sobre estes. Assim, por exemplo, num
caso de torcicolo, ao invés de massagear o pescoço, o terapeuta pode preferir
estimular com o toque, moxa ou agulhas, certas Cavidades (entidade morfológica
que definiremos mais à frente) no pulso ou no tornozelo que influem nos Canais
que passam pelo pescoço, muitas vezes obtendo resultados imediatos e
surpreendentes para quem está habituado ao referencial anatômico/localista.
Zangfu
Os zangfu são os grandes centros que
sediam os espíritos, armazenam as essências e produzem o qi no corpo humano.
Cada um tem um papel na dinâmica vital, o que veremos mais à frente. Partilham de
algumas características com os órgãos internos tal como são descritos na
biomedicina, mas não lhes são idênticos, possuindo também associações com as
emoções, os ciclos sazonais etc. O repertório de funções que se atribui à esses
órgãos será esclarecido ao falarmos da dinâmica vital da RMC.
Existem doze zangfu, distribuídos
igualmente entre yin e yang, formando seis pares. Cada um desses pares Zang-Fu
encontra-se ainda relacionado a uma das Cinco Fases. Podemos considerar os zangfu
como sendo a expressão, na instância Homem, daquilo que no Céu são as cinco
direções e os cinco Shen (palavra que corresponde imperfeitamente às idéias de
“espíritos” ou “almas” da nossa cultura) e na Terra as Cinco Fases e os Cinco Sabores
(Eyssalet, J-M., 1988).
Os zang (Coração, Baço, Pulmão, Rins e
Fígado) estão na origem mesma dos tecidos corpóreos. Eyssalet cita a história
de Zhao Chengzi, mestre taoísta que, selando os orifícios dos cinco zang,
morre. Entretanto, as Cinco Vísceras permaneceram vivas, uma vez que seu sopro
não pôde sair pelos orifícios tapados pelas práticas de imortalidade do mestre,
e terminam por reconstituir seu corpo, devolvendo-lhe a existência (Eyssalet,
J-M., 1988, pp 214-215). Esta história demonstra o papel privilegiado que
ocupam os zang na morfologia humana na RMC. Eles são considerados os
originadores dos tecidos, dos orifícios (ou seja, do contato com o mundo
exterior) e dos próprios Fu:
"[Os sopros] ao se expandirem, elaboram os tecidos
e funções necessárias à comunicação e à expansão (tecidos dos membros); ao se
condensarem, reúnem os tecidos e funções indispensáveis à coesão (vísceras
ocas, Canais, Três Aquecedores) ao circularem, liberam as vias da percepção e
da consciência (cinco sentidos - nove orifícios)." (Eyssalet, J-M.,
op.cit, pg. 214)
Tendo o corpo do
Homem sua origem na movimentação do qi Vital dos zang, é natural que as
explicações para as perturbações nos tecidos corpóreos sejam buscadas nos
próprios órgãos. Por exemplo: problemas ósseos pedem uma investigação dos Rins;
problemas nos tendões, do Fígado, e daí por diante, de acordo com a Tabela 2.
Representações dos zangfu
Apartir do séc. XIX, começam a surgir desenhos representativos dos zangfu,
descrevendo sua forma, localização, volume e peso. Tais desenhos, apresentando
ainda certo grau de discrepância entre si, surgiram a partir da introdução na
China de noções médicas ocidentais por missionários protestantes, inicialmente
com Morrison e Livingston, em 1820, e principalmente com a publicação em língua
chinesa de quatro volumes sobre anatomia, em 1851, por Hobson e Mao Cai[xvii].
O advento dessas representações, contudo, não alterou a clínica da medicina
tradicional chinesa significativamente.
Do ponto de vista morfológico, dentre
os zangfu dois casos merecem mais atenção por não possuírem uma imediata
correspondência com os órgãos da Racionalidade Biomédica. São eles o Príncipe
do Coração e o Triplo Aquecedor:
Xin zhu, xin bao ou xin bao lo
"Príncipe do Coração"
Esse órgão é associado ao yin e ao
Fogo. No Ocidente, é costumeiro encontrar as traduções "Pericárdio" ,
"Mestre do Coração", "Invólucro do Coração" e
"Circulação-sexualidade" para seus nomes chineses. É um caso em que
as deficiências e confusões advindas da tendência ocidental a isolar a(s)
medicina(s) de seu contexto cultural se tornam mais evidentes. Xin zhu
significa, literalmente "Coração/príncipe", recebendo a tradução de
"Mestre do Coração". Ora, em toda parte é dito que o Coração é o
principal centro do organismo, a morada do Espírito, e que todas as outras
vísceras são subordinadas a ele. Como explicar, então, um "Mestre do Coração"?
Ocorre que o papel do soberano na cultura chinesa não era o papel de um rei
ocidental: é a virtude De (Tê) do soberano, resultado de sua retidão interior,
que se espalha sobre o reino trazendo a ordem e a prosperidade. Ele age sem
interferir diretamente no andamento das coisas - sua virtude é personalizada e
transposta em ações por seus ministros (de fato, o imperador não podia sequer
ser visto pela plebe: permanecia oculto na Cidade Proibida). Xin zhu pode ser
traduzido como "aquele através do qual o Coração comanda", sendo quem
recebe seu mandato. Eis por que o Xin zhu está associado ao "Fogo
Ministro" xiang huo e o Coração ao "Fogo Soberano" jun (djún)
huo (Rochat de la Vallèe et al., 1979).
Xin Bao é, literalmente, "saco
[que envolve o] Coração". Autores ligados à medicina científica
contemporânea de pronto localizam o Xin Bao no pericárdio. Entretanto, a
primeira associação do Xin Bao às "gorduras amarelas que recobremo Coração" é datada de 1575[xviii],
sendo portanto "recentíssima". Clássicos como o Nanjing[xix]
apontam para a não-existência de um correspondente morfológico concreto para o Xin
Zhu e para o San Jiao ("Triplo Aquecedor", que veremos à frente). o Lo
em Xin Bao Lo significa "fio de seda que segue seu caminho", ou
"rede", sendo também um dos tipos de Canal, como vimos. Segundo Rochat
de la Vallèe et al., esse ideograma também "designa um certo tipo de
relação, que é o de serviço a um meridiano,uma região do corpo, uma víscera..."[xx], o que parece
confirmar que Xin Zhu, que traduziremos como "Príncipe do Coração" é
"aquele que está a serviço do Coração" e o "Canal que transmite
sua virtude pelo corpo".
San Jiao "Triplo Aquecedor"
É uma das vísceras mais controvertidas
da RMC, havendo grande divergência entre os autores. Os textos antigos são, do
ponto de vista ocidental, vagos a respeito da morfologia dessa víscera. Existe
porém consenso quanto ao seu papel na fisiologia do homem, o que do ponto de
vista da RMC é o principal. Literalmente, a expressão sgnifica
"três/chamuscar", sendo jiao composto de "fogo", sobre o
qual se encontra "pássaro de cauda curta, galinha" (Wilder &
Ingram, 1974) o que dá a idéia de chamuscar como quando do preparo de um
pássaro depenado. No ensino da RMC, existe o consenso de que o Triplo Aquecedor
é uma víscera Fu (yang) associada ao Fogo Ministro xiang huo, fazendo par com o
Príncipe do Coração; a ele se encontra associado o Canal Principal yang
intermediário da mão. É dividido em aquecedor superior, englobando o Coração e
o Pulmão; médio, englobando o Baço, Estômago, Fígado, Vesícula e Intestino
Delgado; e inferior reunindo os Rins, Bexiga e Intestino Grosso. Não possui um
substrato morfológico próprio.
Canais de Circulação
O qi vital dos zangfu percorre um
caminho claramente definido. São linhas vetoriais semestrutura anatômica verificável - não “basta
abrir-se alguns cadáveres” para encontrar evidências sobre a dinâmica do qi,
que é típica da vida. Esses caminhos são chamados "Canais Principais",
totalizando doze (um para cada Órgão). Existem ainda outros tipos de Canal: os
"Canais Maravilhosos", "Distintos", "Lo" e
"Tendinomusculares".
Os "Principais", expressão
direta do qi dos órgãos, se agrupam em "pares acoplados". Um
"par acoplado" é formado por dois Canais pertencentes à mesma fase,
associados um ao yin e outro ao yang, situados sempre em um mesmo membro.Por exemplo: à fase terra pertencem o Baço
(seu aspecto yin) e o Estômago (aspecto yang). Os dois formam portanto um par
acoplado, o Canal do Estômago sendo yang nascendo no alto e descendo pela perna
até o pé e o do Baço, sendo yin, surgindo no pé e subindo perna acima em
direção ao Céu. O movimento do qi nesses Canais age como vetorizador do Sangue,
cuja circulação também se dá nos Canais Principais, em proporções variadas: nos
Canais Principais da Bexiga, do Intestino Delgado, do Fígado e do Mestre do Coração
há mais Sangue que qi; nos Canais da Vesícula, Triplo Aquecedor, Rins, Coração,
Pulmão e Baço-Pâncreas, há mais qi do que Sangue; e nos Canais do Estômago e do
Intestino Grosso, Sangue e qi estão presentes na mesma proporção.
Os Canais
"têndino-musculares" consistem em faixas largas, por vezes se
superpondo, estando associados à proteção dos tecidos, ao equilíbrio e
movimentação do corpo e à veiculação do wei qi (o “qi defensivo”). Estão sempre
ligados à um Canal Principal, começando sempre no ponto mais distal destes (a
cavidade jing).
Os "Maravilhosos" são em
número de oito, sempre terminando em um dos "Principais" de natureza yang.
Partilham entre si da característica de movimento ascendente, exceto pelo dai
mai, que é como uma faixa em torno da cintura. São vistos como grandes lagos ou
reservatórios, que acumulam o qi dos doze Canais quando o excesso o leva a
extravasar. Estão intimamente associados à origem da vida, tendo o papel de
guardar o qi ancestral ou original (yuan qi).Veiculam e armazenam o Jing (essência), harmonizando sua circulação com
a do qi nutridor (Maciocia, G. 1989)
Os "Lo" se dividem em dois
grupos, um de dezesseis e um de doze: doze "Lo transversais" e dezesseis
"Lo longitudinais". O primeiro grupo forma pontes entre os
integrantes de um "par acoplado". Agem como comportas reguladoras
quando há diferença de intensidade de fluxo entre os Canais acoplados,
transferindo o qi do Canal em excesso para o dificiente; o segundo grupo acompanha
em parte apenas o trajeto dos "Principais", estabelecendo conexões
internas entre os canais e órgãos que explicam muitas das funções reguladores
das Cavidades. Além dos doze Lo longitudinais relacionados aos doze órgãos,
existem ainda 4 Lo extras: um para o vaso governador, um para o vaso diretor,
um chamado de “grande Lo do Baço-Pâncreas” e o último, pouco referido em
literatura ocidental mas descrito no Su Wen cap. 18, chamado de “Lo do
Estômago” (Xu Li) (Rochat de la Vallèe et al., 1979).
Os "Distintos" nascem nas
grandes articulações, acompanhando os "Principais" conectando-se aos órgãos
sem penetrá-los.
Toda essa rede de canais tem por
principal função a plena irrigação de todos os territórios do corpo pela
vitalidade, unificando o ser e disponibilizando recursos para transferência de
vitalidade – seja de que tipo for – quando necessário (excesso, vacuidade,
ataques do qi perverso etc).
Canais Principais e Intensidade de yin/yang
Existe uma subdivisão do yin/yang em
três partes- superficial, médio e
profundo - que explica a distribuição topológica, nos membros, dos Canais Principais.
Os pertencentes ao yang são tanto mais intensos quanto mais externos (em
relação à posição anatômica chinesa, com os dois braços para cima e palmas para
a frente); nos yin é a profundidade que indica maior intensidade. Os pares
acoplados sempre pertencem ao mesmo nível de intensidade. Por exemplo, no
acoplamento do Coração ao Intestino Delgado (yin e yang da fase fogo príncipe),
o Coração é o zang pertencente ao nível yin mais profundo (portanto mais intensamente
yin) e o Intestino Delgado, o Fu associado ao yang mais externalizado (portanto
mais intensamente yang), mantendo a proporção de intensidade de yin e yang no
par:
Intensidade
Mão
Pé
ya
Tai Yang
Intestino Delgado
Bexiga
n
Shao Yang
Triplo Aquecedor
Vesícula
g
Yang Ming
Intestino Grosso
Estômago
y
Tai Yin
Pulmão
Baço
i
n
Jue Yin
Príncipe do Coração
Fígado
Shao Yin
Coração
Rins
Quadro VOLUME ENERGÉTICO - Autor: Profº Ricardo André
Essa classificação também implica na
associação dos Canais de mesma intensidade e mesma polaridade, criando um grupo
de seis “grandes Canais” ou “níveis”, o que origina mais uma possibilidade de
classificação do adoecimento: síndromes do Tai
Yang, síndromes do Shao Yin etc, que envolvem menos os órgãos que os Canais
propriamente ditos. Por exemplo, um caso de calor no Canal Shou Tai Yang (Intestino Delgado) pode resultar em ardência
urinária (afetando a Bexiga, Zu Tai Yang),
havento transmissão do calor pela rede de Canais dentre do mesmo nível.
Continua: aguarde a II parte de 3
[1] Professor de T’ai Chi
Ch’uan, Técnico em Shiatsuterapia, coordenou a equipe de medicina tradicional
chinesa do Projeto Racionalidades Médicas do Instituto de Medicina Social (IMS)
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), entre 1993/1997.
[2]Uma primeira versão de parte deste
texto foi publicado sob o no. 72 da Série Estudos em Saúde Coletiva, IMS/UERJ.
[3]Lao Tzu, Tao-te King, o Livro do Sentido e da Vida. Ed. Pensamento,
São Paulo, p.37.
[4]Idem, pag.42.
[5] Ibid. pag.47.
[6] Merton, Thomas: A Via de Chuang Tzu, Ed.Vozes,
Petrópolis, 1965, p.146.
[7]Shujing, parte II, livro 2, cap.2. in:
Palmer, Martin: The Elements of Taoism, Element, Dorset, 1991.
[8]Huangdi Neijing So Wen, cap.2, in: Unschuld,
Paul: Introductory Readings in Classical Chinese Medicine, Kluwer
Academic, Londres, 1988, pag.11. Tradução nossa.
[9] Lamentavelmente, perdeu-se
a etimologia deste ideograma. Akahori Akira, contudo, acredita que seja um erro
de transcrição da palavra ye, muito
semelhante, que significa “derreter metal”, que aparece freqëntemente nas
receitas médicas da dinastia Han. Aparentemente a palavra significava
“pulverizar em pó fino” os ingredientes provavelmente com um martelinho de metal.
Como no final dos Han Posteriores essa prática caiu em desuso, sendo
substituída pelo uso de peneiras finas, um erro de copista não foi corrigido
porque ninguém sabia mais o sentido do outro ideograma.
[10] Tse, Lao: Tao Te King,
o livro do sentido e da vida. Hemus, S/D, São Paulo, pag.102.
[11] Wilder, G.D e Ingram, J.H Analysis
of Chinese Characters, Dover, Nova York, 1974, pag.18.
[12] Ko Hung, Baopuzi (séc III-IV d.C), in: Dictionnaire de la Sagesse Orientale, Robert Laffont, Paris 1989,
pag.109.
[13] Ko Hung, op.cit., p.109.
[14] Neste ponto, os autores
divergem: uma corrente defende que a terra possui uma estação própria, a
canícula ou Chang Xia (lit.
"verão longo"), que se situaria ao final do verão. É a época de
chuvas, momento em que o ciclo de plantio e colheita era definido, estando em
jogo a própria sobrevivência das comunidades.Outros autores, como Eyssalet, baseiam-se no Neijing para afirmar que a terra não preside uma estação própria,
recebendo ao final de cada estação 18 dias de comando.
[15] Subentenda-se "Baço -
Pâncreas", que em MTC compõem um Zangfu
único.
[16] "Espíritos" (?),
às vezes traduzidos como "mônadas", "almas vegetativas" ou
"Entidades Viscerais". Representam aspectos do psiquismo, estando
relacionados aos sonhos, à memória, à vontade, ao instinto e à cognição.
[17] Unschuld, 1985, pag.235-6.
[18]Li Chan, Yi Xue RuMen (introdução ao estudo da medicina),
1575, citado em Sivin, N. 1987 pag.128.
[19] Nan Jing, "Clássico
das Dificuldades", possivelmente compilado pouco depois do Neijing (Huangdi Neijing Lingshu Suwen).
Esse clássico é apontado por Unschuld como sendo "O" clássico da
Medicina de Correspondência Sistemática (do yin/yang
e das Cinco Fases), por introduzir novos conceitos na fisiologia dessa
medicina e por ter superado contradições presentes na compilação do Neijing, que incluiria traços de
medicinas anteriores.